sexta-feira, 6 de abril de 2012

Governador Marconi Perillo diz que sua relação com Cachoeira era ‘esporádica, quase mínima’ (Josias de Souza)


Levado ao noticiário em posição incômoda, Marconi Perillo, o governador tucano de Goiás, esforça-se para remodelar o tempo. Tenta apagar do seu futuro Carlinhos Cachoeira, um personagem que se infiltrou no seu passado, obrigando-o a conviver com o pretérito que vai passando pelas manchetes do presente.
Em notas e entrevistas, Perillo tenta dissociar-se da cachoeira de indícios que já engolfou a reputação do senador Demóstenes Torres. Numa conversa com o repórter Leandro Colon, levada às páginas da Folha, o governador foi instado a definir sua relação com o contraventor.
“Esporádica e quase mínima”, declarou. “Nós estivemos juntos em um aniversário e dois jantares aqui na cidade [de Goiânia], onde ele compareceu.” Como que preocupado em evitar novas surpresas desconsertantes, Perillo antecipou-se:
“Eu o recebi no Palácio uma vez, em meados do ano passado, para tratar de assuntos relativos à indústria de medicamentos. Ele pediu para falar comigo sobre incentivos fiscais.”
Por que aceitou reunir-se com um notório fora da lei, conhecido por suas atividades no ramo da jogatina? “Eu recebi porque o senador Demóstenes e duas outras pessoas me fizeram o pedido. Eu o recebi como empresário.”
Mais cedo, Perillo havia declarado a uma emissora de tevê que falara com Cacheira “umaúnica vez”. Cumprimentara-o pela passagem de seu aniversário. O repórter Colon recordou ao governador que as investigações da PF revelam que Demóstenes já conhecia a folha corrida de Cachoeira.
E Perillo: “O importante é que eu não sabia.” Sinal dos tempos. Notabilizado como primeira pessoa a alertar Lula sobre a bomba relógio do mensalão, o governador tucano recorre, em 2012, ao mesmo “não sabia” que o então presidente petista utilizou sete anos atrás, em 2005.
Perillo recordou: “Um dia, no ano passado, na casa do senador Demóstenes, ele pediu ao empresário [Cachoeira] que dissesse a mim que tinha saído da contravenção. Ele disse: ‘Queria dizer ao senhor que estou trabalhando na legalidade’. Na boa fé, eu acreditei.”
Curioso, muito curioso, curiosíssimo. Como governador, Perillo chefia –ou deveria chefiar— um aparato policial que não desconhece a face delinquente do “empresário”. Conhece tanto que uma banda da polícia tornou-se, por assim dizer, sócia do empreendimento.
Indagou-se a Perillo se a participação de policiais goianos na quadrilha não é ruim para o governo dele. “Não para o governo, mas para o Estado.”  Heim?!? “Não são funcionários do governo, mas do Estado.” Hã?!? “São forças de Estado. Participam hoje do meu governo, participaram de governos anteriores e vão participar de futuros.”
Perillo acrescentou: “O que afirmo é que todas as pessoas envolvidas estão afastadas.” De fato, em relação a várias delas o afastamento foi compulsório. Encontram-se atrás das grades. Não por ação do governo goiano, mas do Ministério Público Federal e da PF.
Lembrou-se a Perillo que ocupantes de cargos estratégicos do governo de Goiás frequentam as páginas do inquérito da Polícia Federal. Não é difícil se dissociar disso? “Não seria fácil se eu tivesse algum tipo de comprometimento”, reagiu o governador, esforçando-se para tomar distância da encrenca.
“As pessoas que cometeram deslize ou tiveram alguma relação que respingue no governo vão sair por livre espontânea vontade ou por decreto meu.” Beleza. O problema é que a tese do “não sabia” faz de Perillo cultor de uma prática incompatível com a função de gestor público: a lamentação depois do fato.
Na noite de terça (3), bateu em retirada da equipe de Perillo a chefe de gabinete Eliane Gonçalves Pinheiro, pilhada nos grampos radioativos da Operação Monte Carlo. Nesta quarta (4), pediu demissão o chefe do Detran goiano, Edivaldo Cardoso, apadrinhado de Demóstenes e genro de um ex-sócio de Cachoeira.
No esforço que empreende para fugir do figurino de inocente culpado –ou culpado inocente, conforme o ponto de vista— Marconi Perillo termina descendo ao enredo num papel pouco lisonjeiro. O papel de bobo. É como se rogasse à platéia para ver nele a figura de um gestor 

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